Loading ...

O Fim do Dinheiro? As 8 Respostas Essenciais Sobre o Euro Digital

O Fim do Dinheiro? As 8 Respostas Essenciais Sobre o Euro Digital

O Fim do Dinheiro? As 8 Respostas Essenciais Sobre o Euro Digital

O som das moedas a tilintar na carteira e o toque familiar de uma nota poderão em breve partilhar o palco com uma nova forma de dinheiro. Não, não estamos a falar de mais uma aplicação de pagamentos ou de uma criptomoeda volátil. Estamos a falar de uma revolução silenciosa, orquestrada pelo próprio Banco Central Europeu (BCE): o euro digital.

A notícia de que a Europa está a dar os passos finais na legislação para esta moeda digital tem gerado um turbilhão de dúvidas. As moedas vão desaparecer? Terei de mudar de banco? E, claro, a pergunta que todos fazem: quanto me vai custar?

Com um projeto que poderá chegar em 2029 e custos de implementação estimados em mais de 1,3 mil milhões de euros, é natural que surja a incerteza. Mas o que significa isto, na prática, para si, para as suas poupanças e para o seu dia a dia? Desvendamos as oito perguntas mais prementes sobre o futuro do nosso dinheiro.

1. O que é, afinal, o euro digital?

Imagine uma nota de 20 euros. Agora, imagine que essa mesma nota, com o mesmo valor e a mesma segurança, existe apenas em formato digital, guardada numa “carteira” no seu telemóvel ou num cartão específico. É essa a essência do euro digital.

Trata-se de uma moeda digital de banco central (CBDC). Isto significa que seria uma forma eletrónica de dinheiro público, emitida e garantida diretamente pelo Banco Central Europeu. Seria o equivalente digital exato das notas e moedas de euro que usamos hoje.

Não é uma criptomoeda nem um saldo bancário

É crucial fazer esta distinção. Ao contrário do Bitcoin ou outras criptomoedas, o euro digital não seria um ativo volátil e descentralizado. O seu valor seria sempre estável: 1 euro digital valerá sempre 1 euro.

Também é diferente do dinheiro que tem na sua conta bancária. O saldo que vê na sua aplicação bancária é, tecnicamente, dinheiro de um banco comercial. O euro digital seria dinheiro do banco central, considerado a forma mais segura de dinheiro que existe, sem qualquer risco de falência do intermediário.

2. Por que razão a Europa precisa de um euro digital?

Se já temos MB Way, cartões e transferências, por que motivo o BCE está a investir tanto tempo e dinheiro neste projeto? As razões são estratégicas e visam proteger o futuro económico da Zona Euro.

Os principais objetivos são:

    • Soberania Monetária: Num mundo cada vez mais dominado por gigantes tecnológicos e sistemas de pagamento não europeus (como Visa, Mastercard, Apple Pay), o euro digital garante que a Europa mantém o controlo sobre a sua infraestrutura de pagamentos. Evita a dependência de empresas privadas ou de moedas digitais de outros países.
    • Apoiar a Digitalização: A sociedade está a usar cada vez menos dinheiro físico. O euro digital é uma resposta natural a esta tendência, garantindo que o dinheiro público continua a ser um pilar acessível e fiável na era digital.
  • Fomentar a Inovação: Ao criar uma plataforma de pagamento pública, o BCE espera estimular a inovação no setor financeiro europeu, permitindo que bancos e fintechs criem novos produtos e serviços sobre esta base segura.
  • Inclusão Financeira: Pretende-se que o euro digital seja fácil de usar para todos, incluindo pessoas com menos literacia digital ou sem conta bancária, garantindo que ninguém fica para trás na transição para uma economia mais digital.
  • Resiliência do Sistema: Funciona como um “plano B”. Se os sistemas de pagamento privados enfrentarem uma crise ou uma falha técnica em larga escala, o euro digital assegura que os cidadãos continuam a poder fazer transações.

3. As moedas e notas vão mesmo acabar?

Esta é, talvez, a maior preocupação de todas. A resposta do Banco Central Europeu tem sido clara e consistente: não.

O euro digital não foi concebido para substituir o dinheiro físico, mas sim para o complementar. O BCE já afirmou repetidamente que o acesso ao dinheiro físico continuará a ser garantido em toda a Zona Euro. O objetivo é a coexistência, oferecendo mais uma opção de pagamento aos cidadãos.

O dinheiro físico continua a ser valorizado por muitas razões, incluindo a privacidade, a simplicidade e o facto de ser um método de pagamento que funciona mesmo sem eletricidade ou internet. O euro digital será uma alternativa, não uma imposição.

4. Terei de abrir uma nova conta bancária?

Não exatamente. O modelo que está a ser desenhado prevê que o acesso ao euro digital seja feito através dos intermediários financeiros que já utiliza: o seu banco atual ou outros prestadores de serviços de pagamento autorizados.

A ideia é que possa ter uma “carteira” ou “conta” de euros digitais através da aplicação do seu banco, de forma muito semelhante a como hoje gere a sua conta à ordem ou o seu cartão de crédito.

A distribuição será feita por estes intermediários, que serão responsáveis por integrar o serviço nas suas plataformas, realizar a verificação de identidade dos clientes e oferecer os serviços de front-end. Para o utilizador final, a experiência deverá ser simples e integrada no ecossistema financeiro que já conhece.

5. E as comissões? Pagar com euro digital será gratuito?

A proposta legislativa da Comissão Europeia, que serve de base ao projeto, é muito clara neste ponto: os serviços básicos de pagamento com o euro digital deverão ser totalmente gratuitos para os cidadãos.

Isto inclui abrir e fechar uma conta de euro digital, consultar o saldo e realizar pagamentos do dia a dia. O objetivo é que seja tão gratuito como usar dinheiro físico.

No entanto, poderão existir custos para os comerciantes, tal como acontece hoje com os pagamentos por cartão. O BCE pretende, contudo, que estas taxas sejam competitivas para incentivar uma ampla aceitação. Serviços extra ou mais complexos, oferecidos pelos bancos, poderão ter custos associados, mas a sua utilização básica será gratuita.

6. Qual a diferença para o MB Way, cartões de crédito ou Bitcoin?

Com tantas opções digitais, é fácil ficar confuso. Vamos clarificar as diferenças fundamentais.

Euro Digital vs. MB Way / Saldo Bancário

Como mencionado, a grande diferença é a natureza do dinheiro. O dinheiro na sua conta ou que usa no MB Way é dinheiro de um banco comercial. É uma promessa de pagamento desse banco para consigo. O euro digital é dinheiro do banco central, uma responsabilidade direta do BCE, o que o torna, por definição, livre de risco de crédito.

Euro Digital vs. Cartões de Crédito/Débito

Os sistemas de cartões (Visa, Mastercard) são infraestruturas de pagamento privadas e, na sua maioria, não europeias. O euro digital será uma infraestrutura pública europeia, o que reforça a autonomia estratégica do continente.

Euro Digital vs. Criptomoedas (como o Bitcoin)

Aqui as diferenças são abissais. São, na verdade, conceitos opostos em quase tudo.

  • Emissor: O euro digital é centralizado e emitido pelo BCE. O Bitcoin é descentralizado, sem uma autoridade central.
  • Valor: O euro digital tem um valor estável, indexado 1:1 ao euro físico. O Bitcoin é extremamente volátil, sendo mais um ativo especulativo do que uma moeda para uso diário.
  • Status Legal: O euro digital terá curso legal em toda a Zona Euro, o que significa que será obrigatoriamente aceite como meio de pagamento. O Bitcoin só é aceite onde os comerciantes o decidam voluntariamente.

7. A minha privacidade e segurança estão garantidas?

A privacidade é um dos pilares do projeto. O BCE sabe que, para ser aceite, o euro digital tem de oferecer um nível de privacidade que inspire confiança. O modelo proposto é um equilíbrio entre a privacidade do dinheiro físico e a transparência necessária para combater atividades ilegais.

Está a ser desenhado um sistema com diferentes níveis de privacidade:

  • Pagamentos Offline: Para transações de baixo valor, feitas presencialmente (por exemplo, de telemóvel para telemóvel sem ligação à internet), o euro digital poderá oferecer um nível de privacidade muito elevado, semelhante ao do dinheiro físico. Nestes casos, nem o BCE nem os bancos teriam acesso aos detalhes da transação.
  • Pagamentos Online: Para transações online, o nível de privacidade seria semelhante ao dos pagamentos digitais atuais. Os dados seriam visíveis para os intermediários financeiros para cumprir as regulações de combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, mas o BCE não conseguiria ver os dados pessoais dos utilizadores nem associá-los às suas transações.

O objetivo é claro: criar uma ferramenta de pagamento digital que respeite a privacidade dos cidadãos europeus, em conformidade com o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD).

8. Quando é que isto se torna realidade?

Este é um projeto de longo prazo e o processo está a ser conduzido com cautela. Não espere usar o euro digital no próximo ano. O calendário atual é o seguinte:

Estamos atualmente na “Fase de Preparação”, que começou em novembro de 2023 e durará dois anos. Durante este período, o BCE está a finalizar o regulamento, a selecionar os parceiros tecnológicos e a realizar testes exaustivos.

Apenas no final de 2025 será tomada a decisão final sobre se se avança ou não para a emissão efetiva do euro digital. Se a luz verde for dada, ainda haverá uma fase de desenvolvimento e implementação que poderá demorar vários anos.

As estimativas mais realistas apontam para que um euro digital possa ser lançado, na melhor das hipóteses, entre 2028 e 2029.

O euro digital não é uma ameaça iminente ao dinheiro que conhecemos. É, antes, uma evolução pensada a longo prazo, uma ferramenta estratégica para garantir que a moeda única da Europa se mantém forte, segura e relevante num mundo cada vez mais digital. Embora ainda existam muitos detalhes a serem definidos, o caminho está a ser traçado para o próximo capítulo da história do nosso dinheiro.

A forma como pagamos está a evoluir, e o euro digital é a resposta da Europa para garantir que essa evolução acontece de forma segura, soberana e ao serviço de todos os seus cidadãos.

Miriam Aryeh é especialista em jornalismo digital com foco em mercado de trabalho e qualidade de vida em Portugal. Apaixonada por pesquisa e escrita, dedica-se a produzir conteúdos claros, objetivos e acessíveis para quem busca oportunidades no exterior.

Veja também